Incitação ao crime de estupro, injúria e imunidade parlamentar – 3

Incitação ao crime de estupro, injúria e imunidade parlamentar – 3

A Turma sublinhou outra alegação da defesa, segundo a qual, se as palavras do parlamentar fossem consideradas incitação ao estupro, então as mulheres que aderiram ao movimento iniciado na internet (“eu não mereço ser estuprada”) também o teriam praticado. Ressaltou que se tratara de campanha de crítica e repúdio às declarações do parlamentar. O sentido conferido, na referida campanha, ao verbo “merecer” revela-se oposto ao empregado pelo acusado nas manifestações que externara publicamente. Essas mensagens buscaram restabelecer o sentimento social de que o estupro é uma crueldade intolerável. Ademais, o tipo penal da incitação ao crime é formal, de perigo abstrato, e independe da produção de resultado. Além disso, não exige o fim especial de agir, mas apenas o dolo genérico, consistente na consciência de que o comportamento do agente instigará outros a praticar crimes. No caso, a frase do parlamentar tem potencial para estimular a perspectiva da superioridade masculina e a intimidação da mulher pela ameaça de uso da violência. Assim, a afirmação pública do imputado tem, em tese, o potencial de reforçar eventual propósito existente em parte daqueles que depreenderam as declarações, no sentido da prática de violência contra a mulher, inclusive novos crimes contra a honra da vítima e de mulheres em geral. Por fim, o Colegiado, no que diz respeito às imputações constantes da queixa-crime (calúnia e injúria), reputou que as mesmas declarações emanadas na denúncia atingiram, em tese, a honra subjetiva da querelante, pois revelam potencial de rebaixar sua dignidade moral, expondo sua imagem à humilhação pública, além de associar as características da mulher à possibilidade de ser vítima de estupro. Não cabe, nessa fase processual, concluir no sentido da configuração de retorsão imediata ou reação a injusta provocação. A queixa-crime atribui, ainda, a prática do delito de calúnia, pelo fato de o querelado ter falsamente afirmado que a querelante o chamara de estuprador. No ponto, entretanto, a inicial não narra de que maneira a afirmação do parlamentar tivera por fim específico ofender a honra da querelante, razão pela qual a queixa não pode ser recebida quanto a esse delito. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que não recebia a denúncia ou a queixa-crime.
Inq 3932/DF, rel. Min. Luiz Fux, 21.6.2016. (Inq-3932)
Pet 5243/DF, rel. Min. Luiz Fux, 21.6.2016. (Pet-5243)

Autor: guimadeira

Sou um cara de fé que acredita em sonhos. Fã incondicional de Shakespeare, Paulo Coelho e de Gabriel Garcia Marques, também adoro Neil Gaiman e Steven Spielberg. Ah, também tenho vários livros publicados, sou mestre e doutor em processo penal pela USP e Juiz de Direito. Corredor amador.

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