Prova ilícita e desentranhamento de peças processuais
A Segunda Turma negou provimento a recurso ordinário em “habeas corpus” no qual se pretendia o desentranhamento de peças processuais que fizessem referência a prova pericial obtida de forma ilícita.
No caso, o paciente foi pronunciado pela prática dos crimes descritos no art. 121, § 2º, IV (por duas vezes), combinado com o art. 70 do Código Penal (CP) e com os arts. 306 e 307, “caput”, do Código de Trânsito Brasileiro, aplicando-se a regra do art. 69 do CP. Diante da ilicitude do exame pericial de alcoolemia realizado no sangue do paciente, o tribunal de origem determinou fossem riscadas quaisquer referências aos resultados do exame na denúncia, na pronúncia e no acórdão embargado.
Os impetrantes alegavam que o tribunal de origem, ao reconhecer que a prova havia sido obtida por meios ilícitos, também deveria ter declarado a ilicitude e determinado o desentranhamento das peças processuais que se reportavam ao exame de alcoolemia (denúncia, sentença de pronúncia e acórdão do recurso em sentido estrito), nos termos do art. 157, § 1º, do Código de Processo Penal (CPP). Tal atitude evitaria que esses elementos influenciassem no convencimento dos juízes leigos do Tribunal do Júri.
A Turma, inicialmente, indeferiu o pedido de suspensão do julgamento pelo Tribunal do Júri até a preclusão da pronúncia. Isso ocorreu em razão da existência de “habeas corpus” impetrado em favor do paciente e afetado ao Plenário (HC 132.512).
Quanto ao pedido de exclusão das peças processuais, assentou que a denúncia, a pronúncia, o acórdão e as demais peças judiciais não são provas do crime. Por isso, em princípio, estão fora da regra constitucional que determina a exclusão das provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI, da CF/1988).
Asseverou, ademais, que o art. 157 do CPP, ao tratar das provas ilícitas e derivadas, não prevê a exclusão de peças processuais que a elas façam referência. Entendeu, ainda, que o tribunal de origem acolheu interpretação teleológica favorável à defesa, ao determinar que as referências ao resultado do exame fossem riscadas das peças processuais.
Ponderou que as limitações ao debate em plenário, mencionadas nos arts. 478 e 479 do CPP, com redação dada pela Lei 11.689/2008, são pontuais e vêm recebendo interpretação restritiva pela Corte, bem como que a exclusão de prova ilícita não é contemplada nas normas de restrição ao debate. Em suma, a exclusão de peça que faça menções à realização da prova e ao debate quanto à validade da prova não é uma consequência óbvia da exclusão da prova.
Ressaltou, por fim, que não se aplica ao caso a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que afasta o envelopamento como alternativa à desconstituição da pronúncia por excesso de linguagem. Isso porque os jurados recebem cópia da peça processual relativa à pronúncia e têm a prerrogativa de acessar a integralidade dos autos (arts. 472, parágrafo único; e 480, § 3º, do CPP). Logo, seria incompatível com o rito que a decisão de pronúncia fosse uma peça oculta (HC 123.311/PR, DJe de 14.4.2015; e RHC 122.909/SE, DJe de 9.12.2014).
RHC 137368/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 29.11.2016. (RHC-137368)