Mais cedo eu publiquei um texto discutindo qual crime cometia aquele que estava na frente dos quarteis gritando “forças armadas salvem a nação”.
No decorrer do dia assistimos abismados a invasão a Brasília e a destruição de vários prédios e obras públicas. Façamos uma breve análise sobre os crimes que foram aí cometidos.
Em primeiro lugar, não custa deixar claro, isso não é liberdade de expressão. Isso não está abarcado pela liberdade de expressão.
O primeiro crime que salta aos olhos e o previsto no artigo 359-L do CP:
“Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais: (Incluído pela Lei nº 14.197, de 2021). Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência”.
Houve ali tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito com a restrição do exercício dos poderes constitucionais ante a invasão e destruição daqueles prédios e dos bens ali existentes.
No entanto não me parece que seja este o único crime.
Se notarem a pena ela diz, “além da pena correspondente à violência”.
Ora, neste contexto o CP deixa claro que também deverá ser punida a pena da violência e qual é ela? Vimos pelas imagens que houve agressão a segurança do STF (o que estava a cavalo) e aí a depender da extensão dos danos sofridos por ele pode-se ter lesão corporal leve ou qualificada (art. 129 do CP).
Além destes crimes vislumbro mais dois ao menos: o crime de dano qualificado (art. 163 do CP) e também o crime de organização criminosa caso haja prova de que as pessoas se organizaram para cometer crimes.
Não vejo o crime de terrorismo presente pois ele exige finalidade específica nos termos do art. 2 da Lei e não se vislumbra esta finalidade: Art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.
Identificar os crimes cometidos é relativamente simples. O problema maior está em identificar os agentes que cometeram estes crimes.
É evidente que quem foi pego em flagrante destruindo algum dos poderes vai responder por estes crimes. Isso é simples. A pergunta é, e os demais?
Todos os que lá estiveram mesmo que não tenham entrado nos prédios irão responder por estes crimes? Aí está um dos pontos de maior dificuldade para o sistema de justiça hoje.
Eu falei no outro texto e falo novamente.
O Direito não vai pacificar a sociedade. Com mais de um quarto de século trabalhando com o direito eu aprendi que o Direito pode muito mas não pode tudo.
Nós do direito temos que descer de nosso Olimpo e entender que há muitas outras formas mais eficazes de se pacificar o conflito. O direito, notadamente o penal, é apenas uma delas e não raras vezes não resolve e causa maiores problemas. Olho com preocupação o rumo que as coisas estão tomando e espero que haja sobriedade e firmeza para lidar com este grave momento.
Excelente reflexão, professor.
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Acredito que todos que estiveram lá deverão responder pelos crimes citados, na medida d sua culpabilidade. Os que estavam lá e não entraram, deverão responder como partícipes. A destruição do patrimônio público só ocorreu por causa da massa de pessoas. Os que não entraram, de qualquer modo, induziram e instigaram os que entraram para vandalizar.
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Querido Professor, suas palavras sábias tomam uma força maior nesse momento nebuloso em que estamos vivendo. Parabéns por sua coragem. Vimos neste momento um silencio perigoso. Ninguém fala dos absurdos que estão se perpetrando. Nenhum estado democrático pode permitir que se coloquem 1.000 nelas incluídas crianças em um local sem nenhuma infraestrutura, sob pena, de o Estado estar cometendo um crime maior do que os imputados aos acusados, que estao em um verdadeiro campo de concentração. Quiçá a falta de individualização das condutas criminosas. Parabéns por sua coragem e lucidez.
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